Plantando informação de qualidade.

Boa Vista - RR, 15 de junho de 2025 as 17:56

Indígenas fazem manifestação contra o Marco Temporal

Compartilhe:

Marco Temporal: entenda a tese, as leis envolvidas e a disputa política

O Marco Temporal é uma tese jurídica que propõe que os povos indígenas têm direito à demarcação de terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

Essa interpretação passou a ser discutida no âmbito jurídico e político nas últimas décadas e gerou grande mobilização nacional por parte de lideranças indígenas, ruralistas, juristas e parlamentares.


Base jurídica e a Constituição de 1988

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 231, reconhece aos povos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, e determina que a União deve demarcar e proteger esses territórios.

Art. 231 – §1º:São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.”

A tese do Marco Temporal não está expressa na Constituição. Ela surgiu de interpretações feitas, especialmente por setores do agronegócio e por juristas ligados à bancada ruralista, como tentativa de limitar a expansão de terras indígenas.


Julgamento no STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar a tese em 2021 no Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que trata da posse de terras indígenas em Santa Catarina, envolvendo o povo Xokleng. O processo foi reconhecido como de repercussão geral, ou seja, a decisão terá impacto em todos os processos similares no país.

Em setembro de 2023, por maioria, o STF rejeitou a tese do Marco Temporal, afirmando que ela restringe os direitos constitucionais dos povos indígenas. Para o tribunal, o direito às terras tradicionais não depende da presença física em 1988, que muitos povos foram expulsos ou impedidos de ocupar seus territórios por décadas.


Reação do Congresso: PEC e Projeto de Lei

Apesar da decisão do STF, o Congresso Nacional reagiu aprovando a PL 2903/2023, que visa estabelecer o Marco Temporal por meio de lei ordinária. A proposta foi aprovada:

  • Na Câmara dos Deputados em maio de 2023, com forte apoio da bancada ruralista.

  • No Senado Federal em setembro do mesmo ano.

Além disso, tramita no Congresso a PEC 215/2000, que propõe que a competência para demarcação de terras indígenas seja transferida do Executivo para o Legislativoo que é amplamente criticado por lideranças indígenas e organizações internacionais, por abrir margem à politização do processo.

A PEC ainda não foi aprovada em definitivo, mas é considerada ameaçadora aos direitos constitucionais indígenas.


Impactos e controvérsias

Para os povos indígenas:

  • O Marco Temporal representa risco de perda de direitos territoriais históricos.

  • Pode inviabilizar reivindicações de terras onde povos foram expulsos antes de 1988.

Para o setor ruralista:

  • A tese é vista como forma de garantir segurança jurídica para propriedades rurais estabelecidas em áreas contestadas.


 Conclusão

A disputa em torno do Marco Temporal envolve interpretações constitucionais, pressões políticas, interesses econômicos e direitos humanos. A decisão do STF representa um avanço na proteção aos povos originários, mas a aprovação de leis e PECs contrárias à decisão mantém o tema vivo e polarizado no cenário político brasileiro.


 Fontes de apoio:

  • Constituição Federal de 1988 – Art. 231

  • Recurso Extraordinário 1017365 – STF

  • Projeto de Lei 2903/2023

  • PEC 215/2000 – Câmara dos Deputados